terça-feira, 10 de outubro de 2000

Esotérismo:

GRANDES NOMES QUE ESTUDARAM O GNOSTICISMO EM PORTUGAL:

PESSOA ESOTÉRICO



Não é segredo que Fernando Pessoa se interessava pelo ocultismo e pelo misticismo. Ele estava sempre a escrever sobre a Maçonaria e a Rosa-Cruz (embora não se lhe conheça qualquer filiação concreta em Loja ou Fraternidade dessas escolas de pensamento), havendo inclusive defendido publicamente as organizações iniciáticas no Diário de Lisboa (4 de Fevereiro de 1935), contra ataques por parte da ditadura do Estado Novo.

Podemos dizer que Pessoa, sendo um dos escritores portugueses mais conhecidos no mundo da literatura, é o que mais se aprofundou no campo do esoterismo.

Em sua
auto-biográfica (de Março de 1935), falando sobre sua religiosidade, Fernando Pessoa diz:
"Sou Gnóstico cristão , fiel à Tradição Secreta do Cristianismo, que tem íntimas relações com a Tradição Secreta em Israel (a santa Kabbalah) e com essência oculta da Maçonaria”

Um Livro que eu particularmente recomendo para quem quiser conhecer um pouco esta lado esotérico de Pessoa, éo Livro: Mensagens




DEIXO VOCÊ COM ALGUMAS DAS MAIS BELAS POESIAS
OCULTISTA DE FERNANDO PESSOA:


ÉROS E PSIQUE




"Conta a lenda que dormia
Uma Princesa encantada
A quem só despertaria
Um Infante, que viriaDe além do muro da estrada.
Ele tinha que, tentado,
Vencer o mal e o bem,
Antes que, já libertado,
Deixasse o caminho errado
Por o que à Princesa vem.
A Princesa Adormecida,Se espera, dormindo espera,
Sonha em morte a sua vida,
E orna-lhe a fronte esquecida,
Verde, uma grinalda de hera.
Longe o Infante, esforçado,Sem saber que intuito tem,
Rompe o caminho fadado,
Ele dela é ignorado,
Ela para ele é ninguém.

Mas cada um cumpre o DestinoEla dormindo encantada,Ele buscando-a sem tino
Pelo processo divino
Que faz existir a estrada.
E, se bem que seja obscuro
Tudo pela estrada fora,E falso, ele vem seguro,
E vencendo estrada e muro,Chega onde em sono ela mora,
E, inda tonto do que houvera,
À cabeça, em maresia,
Ergue a mão, e encontra hera,E vê que ele mesmo era
A Princesa que dormia."


Fernando Pessoa



NO TÚMULO DE CHISTIAN ROSENKREUTZ

I

Quando, despertos deste sono, a vida,

Soubermos o que somos, e o que foi

Essa queda até corpo, essa descida

Ate á noite que nos a Alma obstrui,

Conheceremos pois toda a escondida

Verdade do que é tudo que há ou flui?

Não: nem na Alma livre é conhecida...

Nem Deus, que nos criou, em Si a inclui


Deus é o Homem de outro Deus maior:

Adam Supremo, também teve Queda;

Também, como foi nosso Criador,


Foi criado, e a Verdade lhe morreu...

De Além o Abismo, Sprito Seu, Lha veda;

Aquém não há no Mundo, Corpo Seu.


II


Mas antes era o Verbo, aqui perdido

Quando a Infinita Luz, já apagada,

Do Caos, chão do Ser, foi levantada

Em Sombra, e o Verbo ausente escurecido.


Mas se a Alma sente a sua forma errada,

Em si que é Sombra, vê enfim luzido

O Verbo deste Mundo, humano e ungido,

Rosa Perfeita, em Deus crucificada.


Então, senhores do limiar dos Céus,

Podemos ir buscar além de Deus

O Segredo do Mestre e o Bem profundo;


Não só de aqui, mas já de nós, despertos,

No sangue actual de Cristo enfim libertos

Do a Deus que morre a geração do Mundo.


III


Ah, mas aqui, onde irreais erramos,

Dormimos o que somos, e a verdade,

Inda que enfim em sonhos a vejamos,

Vemo-la, porque em sonho, em falsidade.


Sombras buscando corpos, se os achamos

Como sentir a sua realidade?

Com mãos de sombra, Sombras, que tocamos?

Nosso toque é ausência e vacuidade.


Quem desta Alma fechada nos liberta?

Sem ver, ouvimos para além da sala

De ser: mas como, aqui, a porta aberta?

.......................................


Calmo na falsa morte a nós exposto,

O Livro ocluso contra o peito posto,

Nosso Pai Rosaecruz conhece e cala.



FERNANDO PESSOA



Meu pensamento é um rio subterrâneo

Meu pensamento é um rio subterrâneo.
Para que terras vai e donde vem?
Não sei... Na noite em que o meu ser o tem
Emerge dele um ruído subitâneo

De origens no Mistério extraviadas
De eu compreendê-las..., misteriosas fontes
Habitando a distância de ermos montes
Onde os momentos são a Deus chegados...

De vez em quando luze em minha mágoa,
Como um farol num mar desconhecido,
Um movimento de correr, perdido
Em mim, um pálido soluço de água...

E eu relembro de tempos mais antigos
Que a minha consciência da ilusão
Águas divinas percorrendo o chão
De verdores uníssonos e amigos,

E a ideia de uma Pátria anterior
À forma consciente do meu ser
Dói-me no que desejo, e vem bater
Como uma onda de encontro à minha dor.

Escuto-o... Ao longe, no meu vago tacto
Da minha alma, perdido som incerto,
Como um eterno rio indescoberto,
Mais que a ideia de rio certo e abstracto...

E pra onde é que ele vai, que se extravia
Do meu ouvi-lo? A que cavernas desce?
Em que frios de Assombro é que arrefece?
De que névoas soturnas se anuvia?

Não sei... Eu perco-o... E outra vez regressa
A luz e a cor do mundo claro e actual,
E na interior distância do meu Real
Como se a alma acabasse, o rio cessa...

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