DESVENDANDO A SIMBOLOGIA OCULTA DE LISBOA II
2 parte:
(REPORTAGEM DE VICTOR MENDANHA IN "CORREIO DA MANHÃ, 17.6.1986)
AS HISTÓRIAS QUE OS MONUMENTOS NOS CONTAM
Os monumentos de Lisboa, conforme referimos no nosso trabalho anterior, contam histórias incríveis, algumas delas encobertas por narrativas populares que chegaram até nós mais na forma de mitos e lendas, capazes de serem "decifrados" por quem se debruçar, atentamente, sobre este tema, nem sempre tarefa fácil mas deveras aliciante.
Muitas histórias, tanto ou mais curiosas do que esta são aqui abordadas, em diálogo a que muitos poderão chamar de insólito, outros de irreal e alguns de verdadeiro atropelo aos possíveis segredos de várias organizações iniciáticas.
Mas o único objectivo que nos moveu foi o de informar, fornecendo ao leitor as pistas entregues nas nossas mãos precisamente para isso.
E entremos, sem mais demoras, no assunto que está a prender a vossa atenção.
DA CONCEIÇÃO VELHA AO CASTELO DE S. JORGE
P. - Aqui, na Rua da Alfândega, existe a igreja da Conceição Velha, cujo pórtico é maravilhoso. Quais as figuras mais representativas do monumento?
R. - Junto do Terreiro do Paço temos a igreja de Conceição a Velha, o que nos remete à primitiva Concepção alquímica representada no Velho Testamento por Binah, tanto que antes de D. Manuel I este templo fora a sinagoga dos alfamitas ou residentes de Alfama. A sua fachada exterior, um misto de Gótico e Manuelino, respira e transpira o Feminino transcendente, o Marianismo, ou seja, expressa o aspecto matriarcal de Lisboa Oriental, representado pelo "Braço de Prata", e também as várias fases da Grande Obra Teúrgica/Alquímica, noutros termos, Ergon e Paraergon. Sendo a leitura desta fachada longa e exaustiva, apontarei somente uma personagem, a da coluna central, suporte de todo o eixo escultórico, vestida de varina mas portando a espada e a balança: é a antropomorfização da própria Lisboa. A Bela Luz de Vénus que influi na nossa cidade sob a égide do signo zodiacal da Balança, profundamente ligada às origens histórica e teúrgica do Homem e da Cidade.
Penso mesmo que os motivos ornamentais do Arco da Rua Augusta acaso ter-se-ão inspira- do nas figuras herméticas desta fachada e do seu complemento no extremo oposto da cidade, na rota da "Costa do Sol": a fachada de Santa Maria, no Ocidente do Mosteiro de Belém, a entrada principal que se ficou devendo ao cinzel do mestre-canteiro francês Nicolau de Chanterene, reinan- do D. Manuel I. Aliás, a imagem da Senhora da Estrela (donde, por corruptela, "Restelo") ou dos Reis Magos, uma Virgem Negra, da devoção extremada do Infante Henrique de Sagres, foi trasla- dada da capela do Restelo para Conceição a Velha, em procissão triunfal, pelos freires da Ordem de Cristo, ainda durante o reinado do supradito rei "Venturoso"...
P. - Daqui, de onde estamos, vê-se o castelo de S. Jorge. O que nos pode dizer sobre essa construção?
R. - Pegando na geografia sagrada da cidade e transpondo-a, por analogia, à anatomia humana, teremos o castelo de S. Jorge como o Mental regente de Lisboa. Durante largos séculos, aí estive- ram os paços reais. Foi aí que Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral e Cristovão Colombo, nome guemátrico em que se encobria o português Salvador Gonçalves Zarco, por exemplo, receberam a aprovação da Corte para a demanda de novos mundos para o Mundo Luso.
Sobre o castelo cintila o planeta Júpiter e sendo Júpiter, na Mitologia, o Pai dos Deuses, Deus ou Zeus, não é de admirar que a Península Ibérica esteja sob a égide do signo do Sagitário, este que expressa o Fogo Volátil purificador, o Pater Aether, que se torna Líquido ou purificado, na concepção alquímica, o que é personificado pelo Tejo deslizando manso e dolente às muralhas desta fortaleza.
E são exactamente os Peixes zodiacais do planetário deus Neptuno que regem Portugal, o Portugal da Divina Mãe, Marum, Mare, Maris, Mariz... o Portugal das sempieternas Águas renova- doras, purificadoras e purificadas, verdadeiro Fogo Líquido que se esparge lustralmente como Luz das Nações, dos Ciclos do Mundo, e que se centra em Lisboa, esta a pretendida Capital do V Impé- rio do Espírito Santo, aportando à memórias as profecias e lances vaticinadores do Padre António Vieira, de Gonçalo Anes o Bandarra, de Fernando Pessoa, de Guerra Junqueiro e mesmo de Camões quando cita em "Os Lusíadas", no canto sétimo: "Via estar todo o Céu determinado / De fazer de Lisboa nova Roma / Não o podendo estorvar que destinado / Está de outro Poder que tudo doma".
O SANTO GRAAL TERIA ESTADO NA SÉ DE LISBOA
P. - A Sé de Lisboa é alfobre de histórias incríveis. Edificada em três fases distintas, incluindo o páleo-cristão, o românico e o gótico, consideram-na um dos mais enigmáticos edifícios sacros da cidade. Tem a mesma opinião?
R. - A Sé Patriarcal de Lisboa, mandada edificar como templo cristão pelo rei D. Afonso I de Portu- gal, já teve no seu interior, e segundo certas tradições muito reservadas, a Taça do Santo Graal, a original. Ela esteve aí em custódia durante cerca de quatro séculos e o seu culto foi mantido em segredo por uma misteriosa Ordem de Santos Sábios, à qual as Ordens de Avis e do Templo deram cobertura exterior. Isto aconteceu depois do ano 985 da nossa Era.
Diz-se mesmo existir uma ligação subterrânea entre a Sé, o Castelo e o Convento do Carmo e que uma maldição fatal cairá sobre o profano e curioso que ousar afrontar esses misterio- sos trilhos. Mais não posso dizer.
Na Sé encontram-se, desde o século XII, as santas relíquias do mártir S. Vicente, um dos padroeiros de Lisboa. No brasão da cidade figura a Nau, Barca ou Arca que transportou os restos mortais do santo e que acabou por aportar à costa dos Algarves, mais precisamente ao Promontó- rio Sacro, a ponta de Sagres. Na barca, como elementos heráldicos, também figuram dois corvos, os quais e segundo a tradição, acompanharam, como fiéis e atentos guardiões, os despojos do mártir na sua estranha odisseia até esta Sé Metropolitana de Santa Maria Maior, depois convertida Patriarcal. O corvo, ave saturnina mas também solar, assimilando-se ao cisne negro e ao ganso negro, é o totem de Lisboa, o detentor da Sabedoria Divina e da Profecia "que perscruta o Passado e desvenda o Futuro".
P. - Chegados que somos ao Rossio, neste passeio pela arquitectura esotérica de Lisboa, depara- mos com a coluna dedicada a D. Pedro IV. Como interpretar as figuras esculpidas?
R. - No topo desta coluna monumental avistamos D. Pedro IV que segura, com a mão direita, a Carta Constitucional de 29 de Maio de 1826. Esta obra foi adjudicada ao escultor Elias Robert e ao arquitecto Gabriel Davioud, ambos de nacionalidade francesa. Assemelha-se o monumento a um falo desflorado, a um "linga" hindu ou "mundus" latino, e tem, no sopé, os Quatro Anjos do Destino de quanto vive e se desenvolve no Globo, esses "Fantasmas Cósmicos" de Forças Maiores, por isso mesmo "Jinetes Anímicos", estando demarcando estrategicamente, a partir do "mundus" central", o espaço da "Lisboa quadrada", correspondendo a cada ângulo um símbolo e naipe do Tarot, o que aliás cada um deles ostenta. Se uns lhes dão o nome de Mikael, Gabriel, Rafael e Auriel, então o quinto, representado pelo monarca no topo, futuro Imperador do Brasil, a "Nova Lusitânia" de Pedro de Mariz, acaso também será ele representação régia do 5.º Senhor em formação desse mesmo V Império do Mundo que se está formando.
Um pouco acima estão as Tágides, os "espíritos naturais" do Tejo, as quais formam um cordão protector ou cadeia de união. É realmente, um monumento muito belo portador de um arcaico e transcendente simbolismo que nos reporta, mesmo, às batalhas celestes entre Mikael Solus e Samael Petrus, as quais se terão reflectido, em nossa História, nas lutas sangrentas entre os absolutistas de D. Miguel I e os liberais de D. Pedro IV. Estes acabaram vencendo e se assenho- reando da Terra Lusa.
ESTAÇÃO DO ROSSIO
P. - A frontaria da gare da estação do Rossio, terminal ferroviário que liga Lisboa a Sintra, está arquitecturada em gótico neoclássico. Qual o seu valor simbólico?
R. - Como o seu nome indica o gótico (da raiz gálica God, "Deus") é um estilo que assinala a Asce- se, a contemplação do Divino. Esta é a mais pura, sensível e estética expressão da arte arquitectó- nica de fixar na pedra antes bruta a polidez da Harmonia Universal, o que expressa o Gótico puro, que é flamejante, estilo cuja apoteose vai dos finais do século XIII aos finais do século XV.
Na fachada da estação terminal do Rossio vêem-se duas arcadas cruzando-se à altura do nicho contendo a estátua de D. Sebastião, em tamanho natural, em atitude de defesa, a espada adiante do escudo inclinado 17 graus para a esquerda do possuidor. Seguindo um certo sentido, as arcadas sugerem as ferraduras do cavalo branco do Encoberto que não é o jovem sonhador de de- lírios funestos el-rei D. Sebastião, mas antes este o emblemático régio de um outro Rei muito mai- or que há-de vir, quiçá o próprio retorno do Cristo em Aquarius? Sebastião em hebraico é Sbhs ou "Serpente", é o Grande Dragão da Sabedoria, e não foi por acaso que foi o santo mais querido dos Templários, assim como Santo André o Arquitecto, um outro dos padroeiros de Lisboa.
Repito: o jovem rei do mesmo nome apenas simbolizou algo muito mais elevado. Que se acabe de vez com a confusão que a temática sebastianista, não raro levada ao rubro de certas po- líticas reaccionárias, tem provocado. Já o Miguel de Nostradamus, profeta visionário e hermetista, leva-me a lembrar a sua centúria 32 aquando fito a estátua do Encoberto, dentro do nicho: "O grande império em breve terá mudado / Em primeiro Lugar, que cedo crescerá / Lugar bem ínfimo dum exíguo Condado / Em cujo meio seu ceptro pousará". Ou mesmo a estrofe 70 das trovas de Gonçalo Anes, o Bandarra: "Portugal tem bandeira / Com cinco quinas no meio / E segundo vejo e creio / Esta é a cabeceira / E fora sua cimeira / Que em Calvário lhe foi dada / E será Rei da mana- da / Que vem de longa carreira".
OS RESTAURADORES COM PROMETEU LIBERTO
P. - Outro monumento, por sinal bem perto deste, que possui figuras escultóricas sobre o significa- do das quais poucos se debruçam apesar de passarem, muitas vezes, por perto é o Obelisco dos Restauradores. Poderá desvendar o significado destas figuras?
R. - O Obelisco dos Restauradores, situado na praça do mesmo nome, por sinal com 33 metros de altura, é decorado com dois anjos ongénios, sendo o masculino da autoria de Alberto Nunes e o fe- minino realizado por Simões de Almeida, enquanto o obelisco se deve a António Tomás da Fonseca e foi erigido em 1886 por subscrição nacional, promovida pela comissão central do 1.º de Dezembro.
O anjo masculino representa Prometeu Liberto, por seu Irmão Epimeteu ou Mercúrio; é Luzbel com os grilhões partidos, assim se assumindo na condição espiritual de Arabel e erguendo alto a Lança da Vitória, da Vitória da Libertação do Cáucaso ou "cárcere carnal", representada ob- jectivamente na restauração da Independência Nacional do jugo Filipino, e tudo junto a Vitória dos Deuses que restauraram os valores ancestrais de Lisboa e do Mundo. O escudo triangular a seus pés ostenta o trigo e a vide, logo, em referência em referência à Santa Eucaristia do Rito de Melki- -Tsedek, este se assume, em linguagem teosófica ou iniciática, como o actual "Planetário da Ronda", o Quinto dos Sete "Melki-Tsedek", que é sobretudo uma função hierárquica directora su- prema dos destinos da Terra e de quanto nela vive e evolui.
O anjo feminino representa a contraparte do Senhor da Luz Restauradora, a Rainha do Mundo, Io, Ísis ou Algol, com outros nomes ainda, podendo-se corporificá-la também como a "Lusitânia Triunfante", a Entidade que coroa e abençoa Lisboa, Portugal e o Mundo com a Palma da Vitória. Na destra ela segura o laurel da mesma Vitória Nacional e Espiritual, a décima 13.ª grinalda expressiva de "A Grande Mãe", estando as restantes predispostas em grupos de três nos pontos cardeais do monumento.
As Armas nos lados deste assinalam as forças temporais da guerra e da morte derrotadas pelos poderes intemporais da razão e do espírito, estabilizados no pólo de atracção energética que é o Obelisco.
P. - mas Lisboa possui mais monumentos cuja descoberta do seu simbolismo esotérico muito daria que falar...
R. - Muito fica por dizer, de facto. Poder-se-ia falar, por exemplo, de quanto há de esotérico no antigo restaurante "Abadia" nas caves do Palácio Foz, nos Restauradores; da estátua portentosa do Marquês de Pombal, na rotunda que lhe leva o nome, cujo gradeamento em volta da mesma replete-se de alegorias maçónicas todas assentes sob o ceptro e o báculo, símbolos do Poder Temporal e da Autoridade Espiritual, e todo o monumento assente sobre a Barca de Portugal; do Convento do Carmo ou dos Carmelitas, descendentes daqueles cristãos primitivos, integrados aos Essénios, do Monte Carmelo, para as bandas da Palestina; da Basílica da Estrela, "símile" do Ter- ceiro Logos, o Homem Cósmico Adam-Kadmon que na Terra é Adam-Heve; do Mosteiro dos Jeróni- mos e da Capela do Restelo, assim como da Custódia de Belém e da Virgem Negra Orago desses dois últimos templos. E mais, muito mais ficando por dizer e assinalar, a memória falha ante a far- tura da Lisboa Artística e Monumental, nisto, repito, já hoje Capital da Europa.
Reportagem (I)
O GRANDE MISTÉRIO DO TERREIRO DO PAÇO *
(REPORTAGEM DE VICTOR MENDANHA IN "CORREIO DA MANHÃ", 16.6.1986)
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Remontagem (II)
DESVENDANDO A SIMBOLOGIA OCULTA DE LISBOA
(CONCLUSÃO)
AS HISTÓRIAS QUE OS MONUMENTOS NOS CONTAM
(REPORTAGEM DE VICTOR MENDANHA IN "CORREIO DA MANHÃ, 17.6.1986)
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Próximas Reportagens:
Jardim zoológico de lisboa
A IMITAÇÃO DO PARAÍSO BÍBLICO
(REPORTAGEM DE FERNANDO DACOSTA IN MAGAZINE DO "PÚBLICO", N. 157 7/3/1993)
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LISBOA DO QUINTO IMPÉRIO
(REPORTAGEM DE MANUELA GONZAGA IN REVISTA 3 DE "O INDEPENDENTE", 8 a 14.10.1999)
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